quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Falta de elevação.





Um problema chamado elevadores
Paulo Ferrero

Lisboa e os lisboetas têm um sério problema com os elevadores. Com os que há e quase deixam de o ser, com os que devia haver e não há. Desde logo os históricos, os ascensores e elevadores de antanho, feitos na época em que se combatia o atraso em relação à vanguarda europeia com obra de facto, mas onde não se apregoava à boca cheia o refrão da Mobilidade, mas antes se pugnava por boas condições de locomoção.

Falo dos ascensores do Lavra (1884), Glória (1885) e Bica (1892), e do elevador vertical de Santa Justa (1902): às avarias e ao vandalismo reincidentes, tem-se juntado uma aflitiva inacção e falta de imaginação de quem de direito para os explorar devidamente. Vejamos o Lavra: Carris, CML e IPPAR (ao tempo) ignoraram a construção onde funcionava a maquinaria original a vapor e que daria um excelente «museu do ascensor». Na Glória: o estado ruinoso de abandono do lado do Lg. Oliveirinha (teremos sido bombardeados na 2ª Guerra Mundial sem que o soubéssemos?), uma miséria. Já ao elevador vertical que leva ao Carmo, é comum atribuí-lo, mesmo em publicações oficiais, a Eiffel, quando na realidade foi Mesnier du Ponsard quem o desenhou.

Mais ridículo é a história do Elevador de S. Julião (1897), ao cimo da colina de S. Francisco, às Belas-Artes e também da autoria do luso-francês: em 1915 alguém achou por bem desmantelá-lo, e agora a Frente Tejo parece querer voltar a tê-lo, ainda que feito de outros materiais e em local próximo. Sintomas de esquizofrenia?

Também no Urbanismo, a relação com os elevadores tem sido esquisita, desde que os há, claro. Se nas zonas históricas feitas de prédios mui antigos e baixos, o défice será difícil de anular sem destruir a morfologia de ruas e quarteirões, já no Chiado (e Baixa, por arrastamento inevitável) ou no Bairro Azul, a preguiça em se encontrarem soluções que passem pela instalação de elevadores nos saguões, comuns a vários prédios de uma só vez, faz com que se vá optando pela solução fácil, quantas vezes criminosa, de se destruir os interiores dos prédios e as caixas de escada originais, com a complacência, claro, dos de “lá de cima”. Confrangedor, também, é reconhecer que no apogeu urbanístico de Faria da Costa, e discípulos, se construiu, e bem, esquecendo-se por completo do elevador.

Igualmente confrangedor é o Metropolitano, cujos acessos originais sem elevadores nem escadas rolantes foram sendo contrários a uma efectiva Mobilidade. Mas caricato é assistir-se, meio século passado, a avarias prolongadas (falta de pagamento?) nos elevadores feitos nem há 15 anos (Rossio, Rato, Baixa-Chiado, etc.), quando não à colocação indevida das respectivas saídas à superfície, destruindo vistas e obstaculizando à efectiva mobilidade pedonal.

Pelo exposto continuo a preferir as escadas.

In Jornal de Notícias (6.1.2011)

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