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A avó Irene tinha uns óculos com lentes que pareciam fundos de garrafa e que lhe tornavam os olhos muito pequeninos. Aos domingos a avó Irene gostava de nos oferecer bolos. Lembro-me de apanhar o eléctrico no Largo do Calvário, o n.º 18, que por lá passava a caminho da Ajuda ou na direcção da Praça do Comércio. Era junto da estação fluvial dos barcos para Cacilhas e para o Barreiro que algumas mulheres se reuniam a vender bolos que para ali transportavam em grandes cestos de verga cobertos por panos brancos de linho. Custavam um escudo a dúzia – é verdade, um escudo uma dúzia de bolos – ainda hoje me lembro, os bolos de arroz, os queques e as arrufadas. Sim, porque as bolas de Berlim com creme eram um bocadinho mais caras. A clientela era muita e vinha de vários sítios da cidade. Depois, sentávamo-nos a comer os bolos e a ver o Tejo no Cais das Colunas. Os barcos a chegar e a partir. O Cristo-Rei a crescer, a Ponte a ser construída. No fim, íamos ao Martinho da Arcada beber uma gasosa ou um pirolito que dava direito a bilas e regressávamos ao Cais das Colunas, onde nos esperava sentada a avó de óculos com lentes que pareciam fundos de garrafa e lhe tornavam os olhos muito pequeninos. Nunca mais terei estes domingos com a avó Irene no Cais das Colunas.
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1 comentário:
Um excelente ano novo para todos os S.O.Ses....
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