segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Filipe Pinto Soares.







Filipe Pinto Soares. O professor Pardal chegou às artes
Por Clara Silva,


Um assador de bebés, uma kalashnikov com os despojos do mundo depois da destruição dos homens ou uma bomba que planta árvores. Filipe Pinto Soares é o engenhocas dos artistas nacionais


No liceu, Filipe Pinto Soares era conhecido pelos colegas como o professor Pardal. “Desde pequeno que gosto de inventar coisas e modificar peças”, conta o artista de 37 anos. “Quando os meus pais me davam carros telecomandados e brinquedos do género, eu desmontava-os e criava o meu próprio porque não achava piada nenhuma aos originais. Era o engenhocas da família.”

Ser engenhocas sempre foi um hobby, até 2007, altura em que Filipe começou a levar isso mais a sério. “Estudei restauro, tirei Design [na St. Martin’s School of Art, em Londres, onde estudaram muitos artistas famosos, entre eles a cantora PJ Harvey, que lá tirou um curso de Escultura] e também Produção de Vídeo.” Foi quando começou a trabalhar como assistente do artista plástico português Miguel Palma que Filipe pensou que as suas invenções tecnológicas poderiam ter potencial artístico. “Achava que nunca podia levar esta faceta profissional muito a sério, mas o Miguel Palma convenceu-me de que tinha perfil de artista e não de assistente.”

Em vez de olhar para um quadro, Filipe diz que prefere objectos que se possam alterar. “Gosto de arte com movimento, objectos com interacção, que as pessoas possam ligar e desligar e mudar a cor. Por exemplo, se estão fartos de uma peça que tem a luz vermelha, podem pôr uma luz amarela... esse tipo de interactividade.”

No seu ateliê, Filipe começou a construir peças tão estranhas como um assador de frangos com bonecos de bebés, que até anda à roda e acende uma luz – ou uma AK-47 gigante com um campo verdejante lá dentro. “Quase todas as minhas peças funcionam”, diz Filipe. O “assador de bebés”, que na verdade se chama “Baby Boom”, está neste momento em exposição na galeria Art Lounge, em Lisboa. “Fiz essa peça há uns dois anos, quando o meu filho nasceu. Talvez seja a mais pessoal.” Na mesma galeria, onde Filipe terá uma exposição individual em Março ou Abril de 2012 (a data ainda não está confirmada), está também outra peça irónica. “Chama-se ‘Instant Island’ e é uma bomba com uma ilha lá dentro. A ideia é que quando uma pessoa a lance ao longo da costa ela dê origem a uma ilha.”

Aliás, as alusões às ameaças nucleares foram um dos temas principais de “Along The Way”, a exposição de Filipe Pinto Soares no Espaço Tranquilidade, em Lisboa, durante o ano passado. “Tree Bomb”, que também lá esteve, é uma cópia da bomba atómica de Hiroshima com uma árvore lá dentro. “A própria árvore tem a forma de cogumelo da explosão”, explica Filipe. “É uma bomba que em vez de destruir, cria.” Já a AK-47, chamada pelo artista de “AK Paradise”, é uma reprodução do mundo depois de ter sido destruído pelos homens e pelas armas. “É como se os humanos tivessem desaparecido. Só ficaram os animais, os carros e as armas.”

Outra das peças emblemáticas do artista esteve em exposição no centro comercial Braga Parque em Setembro e no centro de Braga, Barcelos e Vila Nova de Famalicão nos meses seguintes. “Eu, o Alexandre Farto [o artista Vhils], o [músico] Tiago Bettencourt e os StoryTailors fomos convidados para criar peças que representassem a juventude.” Filipe construiu uma grande maquete de uma montanha russa – “que representa a vida adulta” – e uma ilha suspensa, “a infância”. A peça demorou perto de três meses a fazer, já que grande parte dos objectos são encomendados da internet. “Muitos são de modelismo, como a relva. Mas o meu trabalho não é modelismo, procuro estes objectos porque duram muito tempo.”

Filipe pegou também no seu computador da adolescência, o ZX Spectrum e encheu-o de árvores. “[Spectrum Memories] representa as mudanças tão rápidas que acontecem na tecnologia. Até um veado já sabe como funciona.” Algumas destas peças estiveram na feira de arte contemporânea ARTE Lisboa e vão agora embarcar para a ARCO, em Madrid.

Antes de ser artista, Filipe tinha uma marca, a Relectro, e produzia objectos de decoração vintage com tecnologia. “Criei um candeeiro que tinha uma rádio pirata e reproduzia o som do iPod e um móvel que controlava todas as luzes da sala.” Um verdadeiro professor Pardal.

(jornal «i»).

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