País flor
por RUI PEDRO TENDINHA.FOTOGRAFIA RODRIGO CABRITA/GLOBAL IMAGENS
Relato de uma utopia. Daquelas saídas de um sonho de generosidade e patriotismo. Tó Romano, figura maior da moda portuguesa, sonhou que se floríssemos o país inteiro tudo mudava. Acabava a crise e transformávamo-nos na nação mais bela do mundo. Este movimento de pensamento positivo é mesmo para ir para a frente. E já há cidades a acreditar no seu sonho...
«Sei que muita gente pensa que eu endoideci com esta história das flores», começa por dizer. Tó Romano, dono da Central Models, a primeira grande agência de modelos portuguesa, tem consciência de que a sua utopia causa perplexidades. Mas não quer saber. Este homem acredita no seu sonho. Muito basicamente, acredita que Portugal pode embalar numa onda de cultivar flores e se tornar no país mais florido do mundo. Um Portugal onde todos tenham flores à janela, parques e jardins estejam com flores em abundância e onde as autarquias lutem por rotundas com arranjos florais. Ou seja, que Portugal passe a ideia do país mais bonito do mundo devido às flores. Assim mesmo. E tudo começou com um sonho. Um sonho que depois deu um livro, Eva Dream, já editado. O sonho foi imaginar uma pequena aldeia sem graça que mais tarde se tornava na aldeia mais florida de Portugal. Depois disso, vinha outra e assim por adiante. Agora, este ex-manequim leva a ideia a sério: «Por estar ligado ao agenciamento de pessoas e da moda em Portugal, pensam que estou a querer lançar uma nova moda. E estou! Estou mesmo! A base desta ideia está na escrita do livro, onde falo do relacionamento de pessoas e flores, em que se pode criar afectos. Mas no centro do livro está aquele sonho que tive há 16 anos, onde imaginava a transformação da aldeia do Carvalhal, perto da Figueira da Foz, uma típica aldeia feia portuguesa, na aldeia mais bonita de Portugal. Como? Através de um processo mental em que todas as casas estavam pintadas às cores, rodeadas de flores e trepadeiras floridas. Nesse sonho imaginei que a aldeia seria uma atracção turística ainda maior do que Óbidos... Agora, na Primavera de 2009, já depois da crise da bolsa nova-iorquina, fui instigado por um amigo, o pintor João Murillo, para pensar nessa utopia para o país inteiro. Nesta fase de negativismo, ele acreditava que uma onda global de flores em Portugal poderia ter efeito. E foi a partir daí que imaginei esta utopia total que proponho a Portugal, em que todas as vilas, aldeias e cidades estivessem floridas. E ao dizer floridas quero dizer todas as janelas e varandas com flores, dez vezes mais árvores floridas nas ruas e todos os parques serem ainda mais floridos do que são agora.»
Movimento para jovens
Para Tó Romano, o importante é que este seu manifesto se afaste de conotações políticas e seja uma espécie de movimento para os jovens. Esta sua semente é um apelo a uma acção colectiva da sociedade civil. Uma acção para criar uma união portuguesa em torno de um objectivo, um pouco como o que aconteceu quando todos se uniram nas manifestações para a libertação de Timor Leste ou no caso da proliferação de bandeiras nacionais, durante o Europeu de futebol de 2004. Para quem estiver a pensar que esta utopia é apenas um desvario romântico, o empresário da moda acredita que haveria efeitos que poderiam mudar o destino triste deste país. Economicamente, julga que seria um bálsamo, sobretudo para o turismo ambiental, onde se poderiam criar milhares de novos postos de emprego e também o aparecimento da indústria da flor em peso. E é por isso que insiste em reflectir: o que aconteceria se Portugal tivesse a imagem de país mais florido do mundo? «É que nem dá para imaginar como seria tão lindo!», diz, com a emoção à flor da pele. E continua: «E essa imagem passaria por uma conjugação de três pilares: desígnio, imagem visual e alma, tudo vectores que o país pode puxar através das flores.» Este flower power que há anos que não sai da cabeça de Tó Romano é um sonho para partilhar e pensar: «Todo este sonho está sustentado. As implicações económicas seriam incríveis. Qualquer estrangeiro que viesse a um Portugal assim florido decerto que não sairia daqui sem ficar espantado e maravilhado. Nenhum político, analista ou economista apresenta uma solução para o país. Sou da opinião de que a imaginação é o nosso maior recurso e esta ideia Eva Dream não apresenta uma solução política, mas sim uma solução que tem que ver com o mundo dos afectos e das emoções, que, por acaso, encaixa com as características do país a nível de clima, geografia e paisagem diversa. Além do mais, as flores têm que ver com os portugueses.» Dá exemplos de que esta utopia seria um dominó de sinergias positivas ao nível de produção, em especial no turismo ambiental, que funciona de Janeiro até Dezembro. De alguma forma, o turismo português deixaria de estar refém do turismo do sol. Romano está seguro de que o impacte de um turismo ambiental forte faria crescer exponencialmente o mercado de spas, já para não falar de que o país mais florido do mundo obrigaria à construção de mais turismo rural, ou seja, haveria uma revolução turística que faria que o interior e as serras abrissem mais unidades hoteleiras: «Sermos o país mais florido do mundo faria que fôssemos vistos com uma imagem muito positiva. Criaríamos simpatia à nossa volta. E ao termos sucesso no turismo ambiental com os estrangeiros, em especial o turismo e a habitação rural, estou em crer que pelas nossas condições climáticas conseguiríamos ser o grande reequilibrante de stress mundial, poderíamos mostrar ao mundo o valor daquilo que é nosso. Tornaríamos sustentável a nossa produção nacional. Tudo isto seria a alavanca para promover e dar a conhecer produtos como o nosso vinho, o nosso azeite, os nossos queijos e até o nosso presunto, pois na zona de Barrancos temos o porco preto que deu origem a que os espanhóis o fossem buscar para criar o famoso Pata Negra...», continua, entusiasmado.
Efeito dominó
Outra das consequências desta onda florida pode ser o investimento nas preocupações ambientais e paisagísticas. «Neste momento não falamos da natureza. Esta minha utopia encanta-me, pois faria que as consciências mudassem no que toca a preservar o ambiente. Haveria um efeito dominó na produção nacional: passaríamos a fazer mais mel, por exemplo... e mesmo na produção de flores. Quando pergunto qual o país flor as pessoas respondem: Holanda. Ora, acredito que podíamos ultrapassar a Holanda, que só tem campos floridos para produção. Nós podíamos ficar com o negócio da flor e exportar para o mundo inteiro. Nasceria um novo sector importante. Se esta propagação começa, não pára. Cada vez mais, o índice de alegria fica mais forte. Em cada Primavera, os arbustos, as trepadeiras, estariam mais fortes! Se isto começar, não acaba. E ficaríamos o país mais florido do mundo. E, lá está, começava-se a produzir perfumes...». Se antes éramos inundados por emigrantes a vender-nos na rua e nos restaurantes aquelas flores murchas e meio embalsamadas ao som do famoso qué flô?, assim tudo mudaria. Tó Romano vê mais mudanças: «Os portugueses voltariam a viver mais espalhados e deixaria de haver tantas áreas desertificadas. Um dos efeitos seria a diminuição de fogos. Outros dos efeitos seria uma inevitável aposta na agricultura biológica. E aí podíamos ser o celeiro dos produtos biológicos para toda a Europa! Isso levaria a que fôssemos o primeiro país a inverter a tendência das pessoas irem do campo para a cidade. Penso que surgiria uma nova forma de regionalismo...Enfim, acréscimos que estão colados uns aos outros e ainda nem falei do incremento na indústria das energias renováveis ou da cosmética...».
Se alguém lhe perguntar, «mas...agora a sério, acredita mesmo que é possível?», responde sem pestanejar que sim. Porque sabe que os portugueses são capazes de se unir em torno de causas comuns: «Acredito mesmo que é possível plantar flores de norte a sul neste pequeno país à beira-mar plantado. E uma utopia, neste século, para se realizar só é possível através da propagação de emoções positivas que abranja toda a sociedade civil. O repto está lançado e passa por um princípio de uma nova imagem para Portugal. Uma imagem alavancada na beleza, capaz de provocar uma euforia na sociedade e subir a nossa auto-estima colectiva. Os resultados seriam surpreendentes.»
O ponto de partida
Depois de uma conferência Eva Dream em Amarante, Tó Romano garante que esta cidade nortenha arrisca-se a ser a primeira cidade portuguesa florida. «Estão já a acontecer iniciativas incríveis em torno da flor em Amarante! E era um local sem tradição nenhuma a esse nível, ao contrário de tantas outras localidades onde há festas tradicionais baseadas em flores, como é o caso mais conhecido da festa de Campo Maior ou da festa dos tabuleiros em Tomar. As aldeias históricas e de xisto de Idanha-a-Nova também vão ter acções com sponsors a nível de inundação de flores...» Segundo o plano utópico de Tó Romano, o sucesso de uma cidade pode ser sinal de propagação para outras. Na Primavera de 2012 podem começar a aparecer as primeiras ilhas flores. Em breve várias figuras públicas e uma página do Facebook vão começar a promover esta campanha florida. Mais com os pés no chão, avisa, «para isto passar de onda a movimento é preciso massa crítica. Este sonho não é para ser dirigido por mim, mas sim pelos jovens. O que quero é partilhar!»
(in DN/Magazine).
1 comentário:
...campanha semelhante a uma posta em curso durante o Estado Novo... começou pelas varandas, passou às estações de comboio, e nos anos 40 António Ferro já descrevia o país como um presépio...
chegamos a 2011 e mais uma vez querem que o país volte a ser uma aldeia (que se calhar nunca deixou de o ser)
haja massa crítica para ver o rumo que se está a tomar...
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