terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Clube da Mobilidade.





Clube da Mobilidade

Quatro ideias para poupar dinheiro e paciência no trânsito de Lisboa
Um estudo feito há cinco anos concluiu que todos os dias entravam em Lisboa mais de 400 mil carros, com uma média de 1,24 ocupantes. O coordenador desse estudo avança agora com quatro propostas para mudar este cenário e facilitar a vida de quem tantas vezes fica preso nas filas. Por Marisa Soares

As palavras soam bem em tempo de crise mas ainda não estão no vocabulário de muitos dos que circulam em Lisboa. Um estudo feito em 2005, pela empresa de José Manuel Viegas, para a Câmara de Lisboa, estimava que todos os dias entram na cidade mais de 400 mil carros, cada um com 1,24 ocupantes em média. E se em vez de quase vazios os carros andassem cheios, e tanto os proprietários como os ocupantes poupassem tempo e dinheiro com isso? Esta é uma das propostas do projecto SCUSSE, que propõe a criação de um "clube da mobilidade" em Lisboa.

A ideia é angariar pessoas que precisam de se fazer deslocar dentro da Área Metropolitana de Lisboa. Cada interessado inscreve-se nesse clube, que seria gerido por uma entidade cujo papel seria facilitar opções de transporte rápidas e em conta aos inscritos.

Na prática esta proposta, que ainda está a ser trabalhada por investigadores do Instituto Superior Técnico (IST), funcionaria da seguinte forma: a entidade gestora do clube reúne informações sobre quatro opções de mobilidade - carsharing (aluguer de carros à hora), carpooling (basicamente, a vulgar boleia, ou partilha de carros entre pessoas que fazem o mesmo percurso), táxis partilhados e minibus expresso. Uma pessoa que esteja inscrita pode aceder, via telemóvel, a informação sobre estes quatro sistemas de mobilidade, escolhendo depois aquela que mais se adequa às suas necessidades e à sua agenda.

Se tudo correr conforme esperam os criadores desta ideia, o clube pode ser uma realidade dentro de três anos. O objectivo do projecto SCUSSE é contribuir para uma diminuição de 15 a 20 por cento do número de veículos que circulam nas horas de ponta.

Partilhava o seu táxi?

O cenário é familiar: longas filas a entupir as ruas da cidade, falta de lugares para estacionar. "Não podemos condenar quem usa o carro se não há alternativas de transporte público eficazes para todas as agendas", diz José Viegas, investigador do IST e coordenador do SCUSSE.

As quatro possíveis soluções para este problema, afirma, com a criação do tal clube da mobilidade não são novas. Algumas até já foram aplicadas: a Galp, por exemplo, montou um sistema de partilha de carros entre pessoas que fazem o mesmo percurso (carpooling) e a Carris tem o MobCarsharing, com aluguer de carros à hora. Mas a equipa do IST quer dar-lhes novos contornos.

No caso da partilha de táxis, o objectivo é montar uma rede que inclua cerca de 30 por cento da frota actual de táxis de Lisboa, que está "sobredimensionada", sustenta Viegas. "O ideal seria veículos com modelos semelhantes aos táxis de Londres", mais espaçosos, defende. O cliente liga para a central - o "cérebro" que gere o "clube da mobilidade" - e diz onde está e para onde vai. O operador pode procurar um táxi vazio ou então um que, estando ocupado, ainda tem espaço para mais pessoas e está a dirigir-se para a mesma zona.

No final, todos ganham. "Se forem dois clientes, cada um paga 60 por cento da factura que deve para o percurso que faz. Se forem três, pagam 45 por cento. O taxista recebe mais. O trânsito ganha por ter menos veículos a circular", descreve o investigador. O modelo permitiria poupar 16 por cento relativamente ao preço médio pago por passageiro na hora de ponta e oito por cento fora da hora de ponta.

Antes de passar à prática, há questões a resolver. Por exemplo, há que solucionar o problema da segurança pessoal, porque os clientes estão mais expostos a situações como assaltos ou assédios. "O taxista tem de proteger os clientes. Para isso, tem de receber formação especial e ter estatuto semipolicial, o que não acontece actualmente", defende o docente.

Um pequeno expresso

Outra solução fica algures entre o autocarro tradicional e um carro ligeiro. Os investigadores do IST chamam-lhe minibus expresso, um pequeno autocarro que, entre o local de partida e o destino, faz no máximo uma paragem. O sistema é semelhante ao do táxi, mas tem percursos e horários pré-definidos, em função de um grupo de oito a 24 pessoas que moram e trabalham no mesmo sítio. O objectivo é que os passageiros gastem tanto tempo ou menos do que no carro, porque o veículo pode circular nos corredores bus. "Não tem de se preocupar com o estacionamento e até pode ter jornal e café a bordo", sugere Viegas.

Nos estudos realizados, foram identificadas "milhares de pessoas que, nas suas viagens de e para Lisboa, conseguem justificar a criação de uma rede com 60 minibus e garantir o lucro", sobretudo nos corredores de Almada e Sintra, sublinha.

Os cinco alunos de doutoramento envolvidos neste projecto pensaram ainda num modelo de carsharing, que permite sobretudo poupar espaço de estacionamento.

Tal como para chamar o táxi, o cliente liga para a central e pede um carro disponível na zona onde se encontra. Dirige-se ao veículo, vai para o destino e pode deixar o carro aí, com possibilidade de pagar o tempo de estacionamento ou de deixar o veículo disponível para outra pessoa. O objectivo é criar uma rede com 2000 carros para este serviço, o que pode significar um investimento inicial de cerca de dez milhões de euros, segundo as contas já feitas por esta equipa.

Há outra hipótese, que pode interessar a quem não usa o carro todos os dias. "Cada pessoa pode alugar o seu carro particular no período em que não o utiliza, inscrevendo-o na rede", diz José Viegas. Assim, não seria necessário aumentar o parque automóvel. Este sistema já existe em cidades como Londres. "Sabemos que é possível, sem subsídios. É um bom negócio", afirma. E será que os lisboetas aderem? "Quantas pessoas trocam de casa para fazer férias?", contrapõe o investigador, acrescentando que "a casa, apesar de tudo, é mais íntima do que o carro". E em tempos de crise, uma renda extra pode convencer os mais cépticos.

Reservar uma boleia

Outra alternativa é criação de clubes de carpooling, nomeadamente nos corredores de Sintra e Almada, onde os investigadores encontraram "centenas de grupos possíveis".

Segundo José Viegas, dois terços dos grupos de carpooling desaparecem em menos de seis meses. "As agendas pessoais mudam, por isso a solução tem de ser mais flexível", argumenta. Também aqui sobressai o papel da central do clube da mobilidade. "No dia em que não pode ir com o grupo habitual, o cliente telefona e pede um grupo que faça o percurso que tem de fazer, na hora a que precisa", explica.

Quem adere ao carpooling pode instalar no veículo um sistema semelhante ao taxímetro e assim rentabilizar a boleia. O projecto prevê ainda que estes carros tenham privilégios de estacionamento, com lugares reservados na cidade para veículos com dois ocupantes ou mais.

No sistema ideal, o cliente terá mesmo a possibilidade de pedir à central sugestões que facilitem a sua mobilidade. O operador poderá dizer quais os caminhos e modos de transporte mais rápidos e mais baratos para ir do ponto A ao ponto B, sabendo em tempo real onde estão os autocarros, os táxis e os carros.

Para pôr tudo a funcionar, em Lisboa ou em qualquer outra cidade, José Viegas garante ser necessário "muito pouco" dinheiro. "É preciso sobretudo coragem política", alega, sublinhando que a concretização do "clube da mobilidade" não implica criar infra-estruturas. É trabalhar com o que já existe, tornando-o mais eficaz. No caso dos táxis, por exemplo, José Viegas considera que uma rede com, por exemplo, 500 carros pode avançar imediatamente.

"O mais caro", admite, "pode ser a instalação de um novo sistema de bilhética comum para os autocarros, o metro e os táxis." Depois, é também necessário criar um software de base para o "cérebro" do sistema, o que será estudado numa tese de mestrado que arranca no próximo semestre, no IST.

José Viegas admite que a resistência por parte de entidades como as autarquias ou a Autoridade Metropolitana de Transportes de Lisboa pode atrasar a concretização do "clube da mobilidade". E sublinha: "Não encontro liderança para pegar neste projecto como deve ser." Mas o investigador não vai cruzar os braços. "Se Lisboa não quiser, vamos procurar outras cidades da Europa."

(in Público).

1 comentário:

Francisco Jr disse...

Se é para pagar mais pelo taxi, é melhor ir sozinho ou chamar um amigo e pagar o 50% normalmente.