sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Uma noite em Lisboa.





Numa aldeia, dorme-se de noite. Numa cidade, não. Há coisas que acontecem de noite, mas só de noite acontecem. A noite passada, Lisboa teve, por exemplo, uma praxe académica a caloiros de Arquitectura. Há quem seja contra as praxes. Mas quem anda de noite tem de saber uma coisa: de noite, nunca se pode ser a favor ou contra o que quer que seja. Esse é um princípio básico. Vê-se, observa-se, fala-se com as pessoas. Sem juízos nem preconceitos. De dia é que se têm opiniões. De noite, têm-se visões. Visões nocturnas. Boas e más.


No Jardim Júlio de Castilho, às Portas do Sol, finalmente alguém soube encontrar utilidade no tanque/lago que continua vazio há tanto tempo...




Afogar caloiros numa piscina vazia é um divertimento tão inofensivo como qualquer outro. Iô!


Obrigado, rapazes, nós vamos para outra.


Ópera em São Carlos, um clássico na noite de Lisboa selecta e elegante. No Largo, uma tela passava Wagner. O nocturno da noite adensa-se em trevas misteriosas de vozes cavas e potentes.


Desce então, Erda!


Medo primordial!


Fonte de preocupações! Desce! Afunda-te no teu sono eterno!


O meu passarinho voava à minha frente!


A assistência, numerosa, acompanhou Wagner sem arredar pé. Ao frio, a multidão manteve-se firme. Nós, não, que havia mais coisas para ver.



Nas escadarias da Igreja dos Anjos, um grupo de góticos alemães e austríacos. Estes, sim, deveriam ter estado no Largo de São Carlos. Pacatos. Comparados com Wagner, estes amigos bem podiam ajudar à missa na paróquia dos Anjos.


Avisaram logo que não queriam comprar droga. Azar, não foi desta que fizemos negócio.



Só mesmo de noite tropeçamos num grupo de góticos alemães e austríacos frente à Kirche dos Anjos. Cerveja. Muita. Pareceram interessados quando lhes dissemos que em frente ficava a Sopa dos Pobres. Crise, Krisis? Muita.



O coreto frente ao Liceu Camões serve de abrigo a vários sem-abrigo. Não percebemos o que estava ali a fazer um electrodoméstico. Mas há duas outras regras na noite: primeira, não acorde quem quer dormir; segunda, não faça perguntas desnecessárias.


Terceira regra: não abuse das fotografias com «flash». Seja rápido e eficaz.




No coreto, El Comandante vela pelos sem-abrigo que dormem em cima. A revolução pode esperar. Amanhã será outro dia. Boa noite, Ernesto.

P.S. - esta reportagem teve o patrocínio da Cervejaria Ramiro, na Avª Almirante Reis.

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