Queer Lisboa. Queremos todos entrar no armário do São Jorge
por Maria Espírito Santo
O 15.º Festival de Cinema Gay e Lésbico começa hoje. Dizemos-lhe porque deve ir e sugerimos filmes a ver
O festival de cinema mais antigo de Lisboa celebra este ano o seu 15.o aniversário. A "transgressão" é o lema da festa de cinema temática que continua a arriscar, sempre de portas abertas a um público sem restrições. Da comédia ao suspense, há gravações de câmaras ocultas, um filme experimental na floresta e outro antigo mas desafiador, passado nos anos 80. A antestreia nacional de "Uivo" abre o festival (21h) que continua até dia 24. "Howl", na versão original, é um filme sobre o poeta e escritor Allen Ginsberg, interpretado por James Franco. Numa narrativa e filmagem pouco usuais - flashbacks, animação e entrevista são formatos que convivem em harmonia -, assiste-se ao julgamento da obra "Howl", nos anos 50. A criação artística, o surgimento da geração beat e a luta pela liberdade sexual e de expressão são os temas abordados no filme que abriu este ano o Festival de Sundance.
Já ficou com vontade de se dirigir ao cinema São Jorge? Se é novato nestas andanças, João Ferreira, organizador, responde às perguntas que sempre desejou fazer mas sempre teve receio de fazer. "Não há que ter medo", adianta, entre risadas. Tire a prova dos noves na entrevista que se segue.
Sendo heterossexual posso sentir-me mal ou discriminado no Queer - Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa?
De maneira alguma. Estar presente neste festival é igual a estar em qualquer outro. Obviamente que haverá pessoas mais interessadas numa temática ou outra. É óbvio que o festival tem um tema e uma afirmação social e política, mas é para toda a gente.
Devo preparar-me para ver muitas cenas de sexo explícito?
Em proporção igual às de outro festival de cinema. Não é um critério para a escolha de filmes. Nas Noites Hard pode ser mais provável encontrar essas cenas e ainda assim não é regra. Há realizadores conhecidos - por exemplo o John Cameron Mitchell - que tomam a opção de incluir essas cenas.
Que géneros estarão presentes no festival?
Todo o tipo de géneros. É um dos aspectos interessantes, é transversal. De comédia a drama, thriller, suspense e cinema de animação. Gore também. De tudo um pouco.
Serão projectados filmes estrangeiros e também portugueses?
A nossa selecção é feita a nível global. São filmes de 30 países diferentes, sendo cinco deles portugueses. Apostamos muito na variedade, da Indonésia à Argentina.
O tema deste ano é a transgressão. Porquê?
Surge de uma reflexão. De uma escolha muito grande dos filmes feitos nas últimas décadas, nos últimos 15 anos do festival em Lisboa. A ideia é arriscar em narrativas, na estética dos filmes, quebrar alguns cânones. Vamos exibir os melhores filmes dos últimos dois anos. Há filmes que têm estreado nas salas de cinema que têm uma forma de escrever e filmar muito clássicas e até feitas com algum pudor. O cinema queer tem de ter essa importância, de não estar sujeito. Acima de tudo é uma celebração da liberdade.
"Você pode não saber, mas já viu muitos filmes gay." Fale-nos do spot da edição deste ano.
Tem obviamente um lado provocador, de forma a desmistificar o cinema gay/lésbico. Ele está disseminado por todo o cinema. E não há que ter medo.
Uma peça de teatro, documentário, curtas e longas: conheça os destaques
A partir de hoje e até ao próximo sábado, 24 de Setembro, terá cerca de 84 filmes à escolha, aos quais se juntam uma peça de teatro, exposições e a projecção de documentários. Numa agenda cheia, o responsável pelo festival, João Ferreira, dá-lhe seis boas razões para se dirigir ao São Jorge nos próximos dias.
Silenciados
“Uma peça que trata de homofobia” e que “não é propriamente pedagógica”, adianta. “Silenciados” é da responsabilidade da Sudhum, uma companhia de teatro espanhola. Neste espectáculo, com uma forte componente física, contam-se histórias de pessoas que morreram devido à sua opção sexual.
Contam-se cinco pessoas em palco, feridas e mutiladas, que, acabadas de ressuscitar, contam as suas histórias até ao destino final. Um prisioneiro em Auschwitz, um activista gay mexicano, um gay católico, uma transexual assassinada pela polícia e uma vítima de bullying estão entre os diferentes retratados.
Mansfield 1962
A casa de banho dos homens do rés-do-chão do cinema São Jorge estará aberta a homens e mulheres. O espaço receberá uma instalação que integra o festival – na secção “Queer Art”. “Mansfield 1962” é um conjunto de gravações do Verão desse mesmo ano, propriedade do Departamento da Polícia de Mansfield, em Ohio, nos Estados Unidos. Uma câmara escondida que captava os movimentos numa casa de banho pública de um subterrâneo registou homens a terem relações sexuais. As mesmas gravações serviram para condenar uma série de homens por sodomia e foram o mote do trabalho do realizador, autor do vídeo final. William E. Jones encontrou as imagens na internet, montou-as e criou este filme silencioso em tons de preto-e-branco.
Taxi Zum Klo
Ou “Taxi to the Toillet” é um filme alemão de 1981. Está pela primeira vez em retrospectiva esta “obra autobiográfica filmada em Berlim, que tem muito esse lado da transgressão, da liberdade”, confirma João Ferreira. O filme conta a história de Frank, que vive duas vidas distintas: de dia é o professor de uma escola pública e de noite encarna Peggy. De um lado dedicado aos seus alunos, do outro um homem em busca de prazer sexual. Tudo muda quando conhece Bernd, que trabalha no cinema. Envolvido com ele, tenta continuar o mesmo género de vida até perceber que algo tem de mudar. Explícita e provocadora, a obra é de Frank Ripploh, realizador e actor alemão.
Mesa Sto Dasos
É o título original deste filme grego também conhecido por “In the Woods”. Para estas filmagens, um grupo refugiou-se na floresta, com uma valente dose de espontaneidade e imaginação. O resultado: uma aventura experimental com poucas palavras mas muita intensidade visual. No meio da natureza, uma mulher e dois homens exploram os gostos e prazeres sexuais.
Becoming Chaz É o documentário que acompanha todo o processo de transição de uma mulher que quer ser homem. A que não pode deixar de ser referida como a filha de Cher e Sonny é a personagem principal na tela. Chastity (agora Chaz) convida as câmaras e os espectadores a embarcarem na atribulada viagem física e emocional. O documentário de Fenton Bailey e Randy Barbato conta ainda com o testemunho de Cher.
Vibratum vitae
A história de uma relação atormentada pela doença mental e física. Santiago é pianista e não só está doente como também tem um bloqueio artístico, condições que o afastam de Afonso. A curta-metragem portuguesa de Pedro Barão está em competição para a Melhor Curta-Metragem.
(in jornal «i»).
Já ficou com vontade de se dirigir ao cinema São Jorge? Se é novato nestas andanças, João Ferreira, organizador, responde às perguntas que sempre desejou fazer mas sempre teve receio de fazer. "Não há que ter medo", adianta, entre risadas. Tire a prova dos noves na entrevista que se segue.
Sendo heterossexual posso sentir-me mal ou discriminado no Queer - Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa?
De maneira alguma. Estar presente neste festival é igual a estar em qualquer outro. Obviamente que haverá pessoas mais interessadas numa temática ou outra. É óbvio que o festival tem um tema e uma afirmação social e política, mas é para toda a gente.
Devo preparar-me para ver muitas cenas de sexo explícito?
Em proporção igual às de outro festival de cinema. Não é um critério para a escolha de filmes. Nas Noites Hard pode ser mais provável encontrar essas cenas e ainda assim não é regra. Há realizadores conhecidos - por exemplo o John Cameron Mitchell - que tomam a opção de incluir essas cenas.
Que géneros estarão presentes no festival?
Todo o tipo de géneros. É um dos aspectos interessantes, é transversal. De comédia a drama, thriller, suspense e cinema de animação. Gore também. De tudo um pouco.
Serão projectados filmes estrangeiros e também portugueses?
A nossa selecção é feita a nível global. São filmes de 30 países diferentes, sendo cinco deles portugueses. Apostamos muito na variedade, da Indonésia à Argentina.
O tema deste ano é a transgressão. Porquê?
Surge de uma reflexão. De uma escolha muito grande dos filmes feitos nas últimas décadas, nos últimos 15 anos do festival em Lisboa. A ideia é arriscar em narrativas, na estética dos filmes, quebrar alguns cânones. Vamos exibir os melhores filmes dos últimos dois anos. Há filmes que têm estreado nas salas de cinema que têm uma forma de escrever e filmar muito clássicas e até feitas com algum pudor. O cinema queer tem de ter essa importância, de não estar sujeito. Acima de tudo é uma celebração da liberdade.
"Você pode não saber, mas já viu muitos filmes gay." Fale-nos do spot da edição deste ano.
Tem obviamente um lado provocador, de forma a desmistificar o cinema gay/lésbico. Ele está disseminado por todo o cinema. E não há que ter medo.
Uma peça de teatro, documentário, curtas e longas: conheça os destaques
A partir de hoje e até ao próximo sábado, 24 de Setembro, terá cerca de 84 filmes à escolha, aos quais se juntam uma peça de teatro, exposições e a projecção de documentários. Numa agenda cheia, o responsável pelo festival, João Ferreira, dá-lhe seis boas razões para se dirigir ao São Jorge nos próximos dias.
Silenciados
“Uma peça que trata de homofobia” e que “não é propriamente pedagógica”, adianta. “Silenciados” é da responsabilidade da Sudhum, uma companhia de teatro espanhola. Neste espectáculo, com uma forte componente física, contam-se histórias de pessoas que morreram devido à sua opção sexual.
Contam-se cinco pessoas em palco, feridas e mutiladas, que, acabadas de ressuscitar, contam as suas histórias até ao destino final. Um prisioneiro em Auschwitz, um activista gay mexicano, um gay católico, uma transexual assassinada pela polícia e uma vítima de bullying estão entre os diferentes retratados.
Mansfield 1962
A casa de banho dos homens do rés-do-chão do cinema São Jorge estará aberta a homens e mulheres. O espaço receberá uma instalação que integra o festival – na secção “Queer Art”. “Mansfield 1962” é um conjunto de gravações do Verão desse mesmo ano, propriedade do Departamento da Polícia de Mansfield, em Ohio, nos Estados Unidos. Uma câmara escondida que captava os movimentos numa casa de banho pública de um subterrâneo registou homens a terem relações sexuais. As mesmas gravações serviram para condenar uma série de homens por sodomia e foram o mote do trabalho do realizador, autor do vídeo final. William E. Jones encontrou as imagens na internet, montou-as e criou este filme silencioso em tons de preto-e-branco.
Taxi Zum Klo
Ou “Taxi to the Toillet” é um filme alemão de 1981. Está pela primeira vez em retrospectiva esta “obra autobiográfica filmada em Berlim, que tem muito esse lado da transgressão, da liberdade”, confirma João Ferreira. O filme conta a história de Frank, que vive duas vidas distintas: de dia é o professor de uma escola pública e de noite encarna Peggy. De um lado dedicado aos seus alunos, do outro um homem em busca de prazer sexual. Tudo muda quando conhece Bernd, que trabalha no cinema. Envolvido com ele, tenta continuar o mesmo género de vida até perceber que algo tem de mudar. Explícita e provocadora, a obra é de Frank Ripploh, realizador e actor alemão.
Mesa Sto Dasos
É o título original deste filme grego também conhecido por “In the Woods”. Para estas filmagens, um grupo refugiou-se na floresta, com uma valente dose de espontaneidade e imaginação. O resultado: uma aventura experimental com poucas palavras mas muita intensidade visual. No meio da natureza, uma mulher e dois homens exploram os gostos e prazeres sexuais.
Becoming Chaz É o documentário que acompanha todo o processo de transição de uma mulher que quer ser homem. A que não pode deixar de ser referida como a filha de Cher e Sonny é a personagem principal na tela. Chastity (agora Chaz) convida as câmaras e os espectadores a embarcarem na atribulada viagem física e emocional. O documentário de Fenton Bailey e Randy Barbato conta ainda com o testemunho de Cher.
Vibratum vitae
A história de uma relação atormentada pela doença mental e física. Santiago é pianista e não só está doente como também tem um bloqueio artístico, condições que o afastam de Afonso. A curta-metragem portuguesa de Pedro Barão está em competição para a Melhor Curta-Metragem.
(in jornal «i»).
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