Quiosques de Lisboa estão a trocar jornais por souvenirs baratos e outras bugigangas
A venda de jornais nos quiosques que a câmara concessiona para esse efeito é cada vez mais residual
Quiosques de Lisboa estão a trocar jornais por souvenirs baratos e outras bugigangas Por Ana Henriques in Publico
"Qualquer dia não há quem venda jornais em Lisboa", antecipa um representante dos ardinas, criticando a redução das margens de lucro. Câmara não explica mudanças de ramo
No topo da cascata de objectos estão os chapéus de palha e os bonés. Às vezes também há umas tábuas para cortar queijo, com faquinha incluída e um azulejo ao meio. Segue-se a secção de leques. A parte central do quiosque é uma verdadeira avalanche de magnetos (ímans) para o frigorífico a dois euros, que extravasam para as portas da banca, abertas para maximizar a área de exposição da quinquilharia. Escondidos num patamar abaixo dos óculos de sol e dos CD, quase no chão, alinha-se meia dúzia de jornais. "Quantos vendo por dia? Uns sete", calcula Vaskar Rahman, um dos imigrantes do Bangladesh que ocupam neste momento muitas das bancas de jornais da Baixa.
Há quiosques que estão a trocar a venda de jornais pela de bugigangas, em especial na Baixa - apesar de os regulamentos camarários não o permitirem. O presidente da Associação de Ardinas de Lisboa, José Matias, diz que tem vindo a pedir à câmara que o negócio dos jornais e revistas possa ser "mais abrangente", e que seja autorizada a mudança de ramo dos quiosques criados para a venda de periódicos. "A venda de jornais já não é viável", declara. Com um quiosque na zona do Arco do Cego, José Matias diz que preferia continuar com os jornais. "Mas como a margem de lucro dos ardinas é cada vez menor, se calhar vou ter de passar a vender águas com sabores e outros produtos para sobreviver." O seu prognóstico não é risonho: "Como as publicações e as distribuidoras se estão marimbando para nós, qualquer dia não há quem venda jornais e revistas em Lisboa."
As dezenas de capas coloridas alinham-se com esmero na banca de Eduardo Carrilho, na Rua de Santa Justa. Com 50 anos, é um dos poucos que ainda resistem a passar a banca à socapa aos negociantes de souvenirs baratos: "Já tive propostas, mas estou aqui de pedra e cal." Depois indigna-se, quando recorda que a margem dos ardinas com os jornais passou de 20, há duas décadas, para os actuais 12% e vacila: "Estou quase, quase a deixar isto." O quiosque uns metros adiante do seu já cedeu aos cachecóis, aos colares e, claro, aos omnipresentes magnetos. O seu proprietário terá invocado a única excepção legal que permite, sem concurso, a substituição do titular da licença de venda: "motivos ponderosos de índole social ou humanitária". Até pode ser verdade, mas associados à mudança de ramo ilegal estão associados negócios de trespasse ou subaluguer igualmente ilegais. Por ocupar o espaço público os ardinas pagam à câmara uma renda que varia entre 40 e 75 euros.
Apesar de o regulamento em vigor determinar que "a licença de ocupação de via pública é intransmissível, nem pode ser cedida a sua utilização a qualquer título, designadamente através de arrendamento, cedência da exploração e franchising", há comerciantes de quinquilharias que chegam a entregar 500 euros mensais aos ardinas para ficarem com um quiosque. Num negócio onde tudo se joga nas pequenas margens de lucro, a proposta é quase irrecusável. "É preferível irmos para casa com um lucro de mais de 400 euros, ou levantarmo-nos todos os dias para abrir a banca às 7h e fechá-la às 20h?", interroga um ardina. O Rossio é um dos locais onde o fenómeno é mais visível. Embora só num dos quiosques os jornais tenham desaparecido por completo, nenhuma das outras bancas tem já os periódicos como principal negócio.
Contactado com insistência pelo PÚBLICO para se pronunciar sobre a questão, o gabinete do vereador Sá Fernandes, responsável pelo espaço público da cidade, prometeu esclarecimentos para ontem, o que não aconteceu.
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As partes sublinhadas do texto.... foram minha iniciativa ...
Como morador da Baixa confirmo e comprovo o acima descrito.
As estratégias da expansão imparável de "souvenirs baratos e outras bugigangas" sofisticaram-se ... O Império do Híbrido, do Plástico e da Esferovite é já Omnipresente naquela que deveria ser a Zona de Excelência e fonte de referência do Carácter e Identidade da Cidade de Lisboa … e pelos vistos … também Omnipotente... pois o Gabinete de Sá Fernandes apesar de "contactado com insistência" não responde … pudera ... teria que reconhecer que perdeu o controle do Espaço Público na Zona Nobre da Cidade com as respectivas consequências para o Prestigio e a Imagem de Lisboa.
António Sérgio Rosa de Carvalho.
(in Cidadania Lx).
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