«António Paixão é o símbolo de uma profissão agora rara: polícia sinaleiro. Regula o trânsito, mas também apoia os idosos da zona. Quis aprender mais e foi para a universidade. É o primeiro polícia sinaleiro a tirar um curso.
A união entre os dois "amores" de António Paixão, trânsito e assistência social, teve ontem o seu corolário: A Universidade Aberta abriu as portas do seu Salão Nobre para fazer a entrega do diploma de curso exclusivamente ao Agente Paixão. Docentes e funcionários da universidade encheram a sala e a comunicação social deu cobertura ao evento. E o reitor, Carlos Reis, já no fim do discurso de entrega, até brincou: "Espero que agora não abra passagem ao trânsito no preciso momento em que o reitor estiver a atravessar a rua".
António Paixão estranha tanta atenção mediática, "deve ser porque somos poucos nesta função", mas reconhece que "ao longo dos anos tenho tentado mudar um pouco e esta profissão ajudou-me a crescer muito, mais ainda com este curso de Políticas Sociais". Agora, com o canudo na mão, o Agente Paixão acaba por admitir: "Confesso que estou um pouco dividido entre acção social e regulação do trânsito, gosto muito das duas coisas".
António Paixão, 46 anos, é um ícone da cidade, uma memória de outros tempos (apesar de tão novo), que o progresso tem vindo a apagar de forma luminosa, com semáforos. "Dança" na peanha (pequeno pedestal no meio do cruzamento), gesticulando indicações, qual maestro, para os milhares de "actores" que todos os dias atravessam o "teatro da vida" que é o cruzamento das Ruas de São Mamede e Escola Politécnica, bem no centro da capital. Crianças no caminho da escola, idosos às compras do almoço, ricos e pobres com destinos vários e ainda, claro, magotes de veículos que desesperam por chegar ao Largo do Rato ou, em sentido contrário, ao Príncipe Real. António Paixão é um dos dois últimos polícias-sinaleiro ainda activos.
O Agente Paixão até pode ter uma profissão em vias de extinção, porém tal não significa que ele próprio se vá deixar 'extinguir'. Não que o seu lugar na PSP esteja em perigo, ou que a Divisão de Trânsito, à qual pertence, vá ficar sem trabalho, longe disso. António Paixão considera-se um "polícia de proximidade", apesar de tal conceito estar mais associado a programas específicos como a "Escola Segura".
Decidiu, por isso, tirar a licenciatura em Políticas Sociais, na Universidade Aberta, logo ali ao lado do sítio onde todos os dias abre os braços ao trânsito, desde 1995. E a escolha não foi inocente, pois resulta do forte contacto social que mantém com a população local, não só a que mora por ali, mas também a que, por razões de trabalho, frequenta o Largo de São Mamede, onde as ruas se cruzam. "O polícia sinaleiro é uma figura carismática, recorrem a nós pelas mais variadas razões", resumiu o agente Paixão.
António Paixão acabou assim por corporizar o espírito do corpo de polícias sinaleiros, criado em 1927 e que chegou a ter 270 efectivos. António Maria Manuel, 68 anos, o polícia sinaleiro que antes exerceu o cargo no mesmo cruzamento, comprovou a forma como são encarados estes agentes: "Sempre fomos olhados por todos como sendo uma pessoa que ajuda". António Maria esteve 26 anos a orientar o tráfego no mesmo cruzamento de Paixão e reformou-se há 14 . Mora na zona e todos ali o conhecem e o cumprimentam."
(in JN, de 2008).
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