terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Alvalade: requiem pelas laranjeiras.


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Moro a dois passos da Praça de Alvalade, zona que tão maltratada tem sido pela Câmara Municipal de Lisboa. Mas nem eu, que já vi acontecer um pouco de tudo nesta cidade e que praticamente deixei de acreditar em qualquer palavra de qualquer político, imaginava o que acaba de suceder: as laranjeiras que há quatro décadas ornamentavam a praça acabam de ser arrancadas por decisão do município. Primeiro desapareceram as da ala nascente, agora foram derrubadas as da ala poente. Deixou de haver laranjeiras na Praça de Alvalade. Eram um património vegetal inestimável da cidade de Lisboa, um autêntico ex libris do género na capital. E foram retiradas ainda carregadas de laranjas: bem as vi há dias, pouco antes do blitzkrieg determinado pelo vereador encarregado dos espaços verdes de Lisboa, José Sá Fernandes, com a ordem para o seu abate a pretexto do "arranjo" da praça. Quase em segredo, sem consulta de espécie alguma aos habitantes da freguesia. O "arranjo", na capital menos arborizada da Europa, é um eufemismo para aumentar o espaço empedrado no passeio - isto é, proporcionar mais uns quantos lugares de estacionamento ilegal à custa dos direitos do peão e do equilíbrio ecológico da cidade. Estando os cofres camarários sem um vintém, como António Costa não se cansa de repetir, percebe-se mal que ainda haja verba para gastar nestas operações cosméticas destinadas a substituir árvores por pedras. Tornando Lisboa uma cidade mais feia e mais inóspita.Esta sanha contra os espaços verdes do vereador Sá Fernandes, que também acaba de autorizar o derrube de pelo menos 46 árvores no jardim do Príncipe Real, a pretexto de que estavam "doentes" (como se tantas árvores pudessem "adoecer" ao mesmo tempo, no mesmo local), esbarra com a tradicional apatia dos lisboetas: ninguém protesta, ninguém se indigna, ninguém se insurge.Se fosse no Porto, onde o bairrismo é uma bandeira, bastaria a suspeita de que estaria em marcha uma operação lesa-ecologia como esta para Sá Fernandes encontrar pela frente uma acção de embargo, que lhe pudesse travar o passo. Ele sabe bem o que isso é, aliás: antes de fazer parte do poder camarário distinguiu-se como o maior embargador da capital. Não na defesa dos interesses da cidade, como agora se comprova, mas na defesa dos seus interesses políticos."Tanto que fazer e metem-se com as árvores. Deve ser por não buzinarem", como escrevia aqui há dias, sabiamente, a Maria Isabel Goulão. Definitivamente, este Zé inimigo das árvores não fazia falta nenhuma a Lisboa. Imagem: as laranjeiras que já não há, no blogue Amigos do Botânico.
(in «O Carmo e a Trindade»).

3 comentários:

Gastão de Brito e Silva disse...

O Zé faz cá uma falta...espero que não tenha planos para Monsanto...

A.lourenço disse...

Más noticias don Gaston,em Monsanto está a decorrer também uma limpeza de mata,esta limpeza é feita a troco da madeira cortada e posso garantir que tem sido bem mais gravosa que no Príncipe Real, pode ver fotos em: www.arvoresaopoder.blogspot.com

No caso de Alvalade, ao que parece as Laranjeiras estavam mesmo doentes devido á poluição, sendo este o caso deveriam ser, em ultimo caso, substituidas por outras já adultas a que seriam aplicado um produto ,já testado em várias cidades, que as protegem. Houvesse vontade.

já agora há que apurar, se é ou não verdade, que os funcionários da CML estão a ser pressionados para que, quando questionados por jornalistas, dizerem que as árvores estão doentes, mesmo que tal não aconteça.

Patty disse...

Há cerca de uma década, cá em Cascais, um Judas de péssima memória tentou arrancar as árvores da Av. 25 de Abril. Também com motivos absurdos, estariam doentes ou prestes a cair, mas dois enormes condomínios tinham acabado de ser licenciados e a ideia seria arrancar as árvores para alargar a Avenida.
A população algemou-se às árvores. As televisões foram todas chamadas. E a altarquia, ao fim de alguns dias de finca-pé, acabou por se render. As árvores aínda cá estão todas...
E aí em Lisboa, são poucos, não se importam, ou ninguém se lembrou de fazer nada? Não há um jornalista menos "arregimentado" que queira pegar no assunto? Ninguém da Quercus para se amarrar às árvores do Principe Real quando o assassínio começou? Agora é tarde.