terça-feira, 11 de agosto de 2009

A Vinha da Ira.



A Tapada da Ajuda foi para mim jardim particular, quintal da casa, herdade da tia, monte no Alentejo, lugar exótico, jardim do paraíso, parque de merendas e de diversões. Morava mesmo à entrada de uma das portas, a de Alcântara, junto à estrada do Alvito. Tinha cartão de sócio e aos fins de semana levávamos merenda para passar o dia em brincadeiras refrescadas com capilé entre campos de trigo que secavam ao sol de Agosto no terreno grande. A Tapada da Agronomia não era nenhum mistério, conhecia-a de olhos fechados - aliás, como todos os miúdos da minha rua que tinham de ir buscar leite fresco às vacarias que ficavam junto do Pavilhão de Exposições. Alguns hectares de vinha no meio da cidade ainda hoje nos surpreendem. O Instituto Superior de Agronomia em parceria com a Câmara Municipal de Lisboa podia ter aqui um espaço privilegiado de grande dignidade para a educação daqueles que nunca foram ao campo. A vacaria já não existe. Vi por lá, num curral, duas ovelhas magras com carrapatos. Os antigos lagares, apesar das vinhas, parece que já não têm utilidade. A Tapada parece abandonada, pedem-nos um euro e cinquenta cêntimos para entrar de carro. Por mim, nem carros entravam. Alguns edifícios novos desvirtuam o parque, enquanto equipamentos antigos se encontram ao abandono. O meu jardim do paraíso, o meu lugar exótico, jardim particular, herdade da tia está em agonia. As escolas levam as crianças em visitas de estudo às grandes superfícies comerciais, a vida no campo parece não interessar nem a professores nem a alunos. E a Tapada definhará, até que um dia esta ou aquela imobiliária lhe proporá um condomínio para lhe retardar a agonia e lhe tratará do óbito. Até lá, a vinha espreita-nos por detrás do muro.
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1 comentário:

DERLY. disse...

olá moro no brasil,mais precisamente em brasilia,acompanho voces há muito tempo mas nunca tinha comentado,como dessa vez tocou num ponto que afeta e o muito a cidade onde moro,resolvi comentar,são os condominios,brasilia é uma cidade tombada pelo patrimonio historico,como houve um forte crescimento a demanda por espaço cresceu demais,com isso surgiram os condominios,regularizados ou não,a partir dai a especulação imobiliaria e tudo que isso gera acaba lentamente com a qualidade de vida,resistir é preciso,abraços.