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Ele era de outra raça, mais escura, e mais velho do que ela. Ela, branca como a neve, toda «urban chic», com armação em alumínio e almofadada em napa. Sentia-se, é certo, um pouco flácida, e sonhava fazer uma lipoaspiração como as senhoras da revista «Caras». Conheceram-se através de um anúncio de jornal. Cavalheiro de meia-idade, culto, boa posição económica, sólido de carácter, com os pés bem assentes na terra, gostaria de conhecer jovem cadeirinha honesta, entre os 25 e os 30 anos, para convívio sério e futuro compromisso. Foi há algum tempo. Hoje, ao fim de uns meses, ele declarou-se, pediu-a em namoro. Um compromisso firme, sólido como o pinho de que foi feito. O alumínio dela ruborizou um pouco, mas, ao virarem para Rua de São Pedro Mártir, ao Martim Moniz, já ela encostava a cabeça no ombro dele. Sonharam ter filhos. Dois ou três banquinhos, que cresceriam até virarem cadeiras, como eles. «E o mais velho, como se chamaria?», perguntou ele. «BPN, querido». Ele não gostou. Sempre quisera ter um varão chamado «BPP». A coisa ficou por aí. E assim, num tranquilo fim-de-tarde como só Lisboa tem, lá foram os dois a descer pela rua, que capinada não estava. Atrás, um pouco atrás, um pombo acompanhava o feliz enlace de mobiliário.
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