O Lote 10 nasceu viçoso, cheio de energia. Tinha um futuro promissor à sua frente. Mas passado algum tempo começou a afundar-se. Ninguém percebia porquê.
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Todos os dias o Lote 10 se enterrava um pouco mais. O seu desejo era que o esquecessem, que o deixassem em paz. Queria desaparecer debaixo de terra. E não havia quem conseguisse puxá-lo para cima. Mesmo com palavras encorajadoras sobre o seu futuro radioso no mundo do urbanismo lisboeta. Como devia estar orgulhoso por ter nascido em Benfica.
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Os engenheiros civis não compreendiam. O Lote 10 tinha sido um filho tão desejado. E interrogavam-se aflitos, “Meu Deus, em que é que nós errámos?”. Não compreendiam porque não conseguem compreender a alma de um edifício. É gente que só percebe de contas, de forças e tracções. Por isso desistiram, abandonaram-no à sua profunda infelicidade.
Depois disso veio outra leva de gente. À noite dormem no interior do Lote 10. De dia ganham alguns cêntimos a arrumar caros ali na Rua de Nossa Senhora do Amparo, frente ao supermercado Modelo. É gente que sabe o que são os problemas da vida e por isso procuram animá-lo. Dizem-lhe para não se afundar, pelo menos não completamente. Mas à cautela instalam-se nos andares mais altos.
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Nossa Senhora do Amparo essa mantém-se indiferente aos desamparados dos habitantes e ao desamparo do edifício em si mesmo. As santas são assim. Mas talvez apenas um milagre resolva a desdita sem fim do Lote 10.
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