O Sr. Carlos Alberto.
Não tem medo de gente que vem de fora. Não tem medo de conversar com gente que vem de fora. Não receia ser fotografado. Nada tem a esconder. O homem tranquilo.
Esqueci-me de perguntar a idade ao Sr. Carlos Alberto. Calculo que andará pelos sessenta anos, talvez mais, talvez menos. Carlos Alberto habita numa casa modesta na Vila Joaquina, no Alto de Santo Amaro, e, ali ao lado, cuida de uma pequena horta num pedaço de terra mesmo à entrada da Quinta da Bruxa. Quantos lisboetas sabem onde fica a Quinta da Bruxa? É também nisto que reside o fascínio das cidades. Há muitas lisboas dentro de Lisboa. A Lisboa de Carlos Alberto não é certamente a Lisboa do Hotel Pestana Palace, cuja entrada fica a poucos metros da Quinta da Bruxa. Mas houve quem pensasse em transformar a Lisboa de Carlos Alberto na Lisboa do Pestana Palace. Chegaram a existir projectos que envolviam a deslocação para outro lugar das dez famílias que vivem na Quinta da Bruxa. Eu não acho bem, nem mal. Não estou pela Lisboa de Carlos Alberto contra a Lisboa do Pestana Palace, ou vice-versa. Mas gostei do Sr. Carlos Alberto.
Senhor de vistas privilegiadas sobre o Palácio da Ajuda e a barra do Tejo, Carlos Alberto cultiva um palmo de terra em terreno escarpado, num local que anos a fio foi desprezado por todos, mas que hoje é cobiçado por especuladores imobiliários. Entre couves e galinhas, Carlos Alberto deixa-se conduzir pelo destino, com bonomia. Talvez o destino acabe por atirá-lo dali para fora. Talvez não, usucapião.
Carlos Alberto parece estar de bem com a vida. Para ele, está tudo bem...
Mostrou-me com orgulho a sua quinta privada.
Aqui, cultiva a tradicional couve portuguesa. E também alfaces, tomates, nabos, nabiças, feijão, batata e cebola, tudo o que uma horta tem.
No mesmo terreno, tem capoeiras com algumas galinhas, de que aproveita os ovos. O Sr. Carlos Alberto também cria coelhos. Contou-me que há tempos uma cobra lhe comeu a criação. Mas tudo bem, são coisas próprias da agricultura. Tudo bem...
Como qualquer agricultor que se preze, Carlos Alberto tem orgulho na sua produção. E mais orgulho tem em mostrá-la a quem vem de fora, de outras lisboas.
Uma imagem de uma horta pode parecer banal. Mas, assim, no meio de Lisboa, é tudo um pouco estranho.
De mãos na anca, qual feliz proprietário, Carlos Alberto observa a cidade que fica à distância, lá longe e lá em baixo. Lisboa ainda lhe permite cultivar as suas couves e criar as suas galinhas. Fiquei com a impressão de que era um homem muito feliz. Mas também ele há muitas felicidades dentro da felicidade. Isto de cidades e de felicidades, cada um sabe de si. Cada um com a sua. E cada um que cuide de si - e da sua horta.
2 comentários:
novamente tema de discussão dos nossos desgovernantes
as hortas urbanas
no Porto a CMP dá água, terra e casinha para arrumar as alfaias agrícolas
em Lisboa a CML quer fazer um inventário e emitir Licenças
DASSSSSSSSSSE
não nos livramos da burocracia
e a CML tem a ideia peregrina de criar uma horta comunitária
que é do mais estúpido que há
É óptimo ter hortas urbanas, faz muito bem à cidade. Venham mais! Propor hortas colectivas é problemático, mas acho muito bem que se afectem zonas do território para este uso tão saudável, educativo (pois sensibiliza para uma série de questões do meio físico), ecológico e preservador da qualidade de vida na cidade.
Enviar um comentário