segunda-feira, 27 de junho de 2011

+ Skillz.







+ Skillz. A casa do Bairro Alto que ensina os vizinhos a ser mais

Há algo novo atrás de cada porta. De lá de dentro saem sons de viola (uns mais afinados que outros), fragmentos de conversas, o barulho dos matraquilhos e até um forte cheiro a álcool.É aqui que mora o bairro em ponto pequeno, com as pessoas, a arte, a noite e a diferença. Chama-se +Skillz: quem quiser entra, quem estiver farto sai, quem decidir ficar, aprende.

Foi em 2009 que nasceu o +Skillz pelas mãos da Associação Mais Cidadania, com o objectivo de ajudar pessoal e profissionalmente os jovens desfavorecidos das zonas do Bairro-Alto e Baixa-Chiado. O projecto ganhou vida através de uma candidatura ao Programa Escolhas, juntamente com outras entidades locais.

"Então como é que anda esse braço?", ouve-se de Sandra Martinho ao fundo da sala para um rapaz com o braço engessado. Anda irrequieta de um lado para o outro, a afixar anúncios e a distribuir papéis. Cada cara nova que entra na sala é motivo para começar outra conversa. Sandra trabalhava na Associação Entre Mundos (uma das parceiras) e foi convidada para liderar este novo projecto. Segundo a coordenadora, após uma fase inicial mais complicada, encontraram uma associação de beneficência na altura em que estava para fechar e ali se estabeleceram. As actividades são direccionadas para os jovens que vivam no Bairro Alto e na Baixa-Chiado até aos 24 anos.

Lá dentro as paredes têm cores vivas, grafitties, desenhos e quadros pendurados e fotografias de Lisboa em molduras de cartão. Muito do que se pode ver por ali foi oferecido por pessoas da comunidade. As pinturas, os desenhos e mesmo alguns pufs e sofás são obra dos cerca de 170 jovens que (quase) todos os dias passam por esta casa.

Acima de tudo, formar É no rés-do-chão, na porta do fundo, que se reúnem vários jovens de olhos postos numa mesa de plástico, repleta de garrafas de álcool. Rum, vodka, uísque, gin são alguns dos líquidos nestas garrafas coloridas.

Podia tratar-se de uma festa de arromba (não estivesse o +Skillz numa das zonas mais noctívagas de Lisboa) mas não, é uma aula. O curso de Barman/Barmaid está agora a decorrer na associação e dá toda a informação teórica e prática necessária. E para quem acha que um curso destes é só andar a agitar bebidas, que se desengane. "Têm higiene e segurança alimentar, preparação e realização de serviço de bar e também aulas de inglês para atendimento", explica Sandra Martinho.

Já na parte prática os alunos sabem mais sobre as propriedades das bebidas e aprendem a fazer diferentes cocktails. "Só podem provar e têm de deitar fora", remata Sandra com um sorriso. Acrescenta ainda que a associação já tem outro curso em mente, que também se adequa às características e necessidades da zona: geriatria.

Antes deste curso decorreu outro, o de DJ e produção musical. Este foi em formato intensivo: durante 3 meses os alunos tiveram aulas todos os dias. O professor era o DJ Bruno Guichon (que já tocou em espaços conhecidos como a Crew Hassan e no Bar do Cais).

Foi depois deste curso e com algumas iniciativas para o público, organizadas pelo grupo que os jovens conseguiram arranjar os meios necessários para construir uma sala especial, no piso de cima. Ainda não está finalizada mas um dia será um espaço de computação e masterização de som, para os mais criativos poderem gravar as suas próprias músicas.

Ainda no rés-do-chão está uma sala cheia com mesas de madeira escura onde estão vários ecrãs. Aqui pode-se passar o tempo entre jogos ou navegar na internet mas também receber formação específica, como é exemplo o curso de iniciação a TIC. Há ainda a oportunidade de se visitar a escola virtual e de ter acesso à matéria das aulas. Foi com a ajuda da parte informática que os jovens já tiveram a oportunidade de montar um filme da sua autoria.

Entreter Depois da sessão de cinema, começa a sentir-se algum reboliço de jovens para cá e para lá, um ou outro com uma viola às costas. Tânia Matos chega entretanto e dirige-se ao sistema de som, compondo as colunas e escolhendo os CDs. "Tens que ser uma pessoa permeável", conta-nos, "se não lhes apetece alguma coisa, tens de ter uma alternativa para os cativar", conta a professora de dança antes de passar para a zona dos sofás e de sentar ao pé dos alunos.

Em qualquer curso, o objectivo é entreter os jovens e fazer-lhes despertar a sua veia criativa. Para isso, há muitos ateliers que podem experimentar para perceberem o que gostam e no que se querem aplicar. Há aulas de viola, dança, artes plásticas, teatro e ilustração. "Eles aprenderam a fazer as suas próprias mochilas para irem para a escola", conta Sandra Martinho com a mala de uma aluna na mão.

Despertar talentos A associação também lança regularmente um concurso em que dá a oportunidade a jovens artistas de apresentarem os seus trabalhos. Todos os meses uma sala do último piso da associação acolhe um artista diferente e todos os sábados as portas estão abertas a quem quiser apreciar. Fidel foi um dos artistas que começou por expor na associação e hoje em dia já trabalha lado a lado com Alexandre Farto, aka Vhils em Londres. "Às vezes o problema não é não serem bons", explicar Sandra, "é não terem forma de divulgar o seu trabalho".


(jornal «i»).

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